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Olha como são pequenos, bate foto, olha tem mais alguns chegando correndo pelo
muro – Ele estava feliz, eu também, afinal essa visão era um privilégio para
poucos, e sentia-me um pouco abençoado nesse sentido.
-- Isso prova que essa cerca
elétrica é só para inglês ver não é filho? Deixa que eu bato... – Ele me olhou com seu olhar mais
maroto e deu um pequeno sorriso.
-- Vou correndo pegar banana – saiu
correndo para dentro de casa.
Eles tem horário sempre entre seis e
nove horas da manhã, é certo que é um horário um tanto quanto flexível, mas é
um horário. Eles vem em um único bando, esse bando tem sempre entre dez a
quinze membros e agora estão acostumados com nossas bananas, então a visita é
rotineira, todas as manhãs.
-- Fico me perguntando como
bichinhos tão pequenos conseguem emitir esse som tão alto filho – Olhei para o
rosto de meu filho que com seu olhar devolveu minha indagação.
-- Trouxe meia dúzia de bananas,
será que dá? – as bananas pareciam meio verdes mas já dava para eles comerem.
-- Filho, meia dúzia é muito, três,
no máximo quatro bananas é a conta para esses esfomeados.
Abri a primeira banana, joguei a
casca, afinal era tudo mato e ali já seguia um pouco de adubo natural, fui
partindo em pequenos pedaços e colocando ao longo do muro, eles, impacientes as
vezes pegavam direto de minha mão, com suas pequenas mãozinhas de no máximo um
centímetro, olhavam-me, acho que cobrando rapidez, estendiam a mão (ou seria
patas? Mas é em formato de mão...) e pegavam os pequenos pedaços de banana.
O silencio fez-se geral, todos
estavam comendo – Ah! Olha as costas desse pequeno deve estar doente, parece um
pequeno tumor filho...
-- Puxa que chato pai, mas olha... –
Onde parecia ser um pequeno tumor, levantou-se uma pequena cabeça, era um
pequeno entre os pequenos, um pequeno filhotinho que não deveria ter a altura
maior que um polegar.
-- Ah! Que danado, de carona no
papai, ou seria mamãe? – Perguntei olhando para meu filho.
-- Isso é contigo pai, conheço menos
que você – Seu olhar parecia mais manso esse dia, esse é meu filho de olhar
mais manso, não que eu tenha preferencias, amo a todos, mas com um a gente se
afina em uma coisa, com outro em outra, com esse talvez fosse na paixão pela
vida, pelos questionamentos da vida e pelos animais e vamos seguindo como família.
-- Bom dia família. – Foi assim que
o moço nos cumprimentou na Galeria do Rock, senti tanto carinho e respeito em
seu comprimento, foi dia de ver tênis caros, mas a grana estava curta,
compramos camisetas e seguimos para almoçar no quilo, quilo caríssimo diga-se
de passagem ou nossa grana que estava
curtíssima.
-- Eles estão com bastante fome hoje
filho, deve ser por conta da família e do bando que aumentaram.
-- Você não acha um privilégio? –
Começou a comer uma banana também. Comilão como sempre, um glutão em essência
como eu fora um dia, atualmente nem o esporte, nem a boca fechada, nem a dieta
vegetariana conseguem controlar as denúncias da balança.
-- Devagar com o andor mano, a
banana é para eles – Usar um pouco do meu “mano” era uma gíria que me
acompanhava desde a adolescência e estava incorporada ao nosso dia-a-dia.
-- Mas você disse que tinha banana
demais....mano. – Brincou ele e já começava a abrir a segunda banana – Vamos
fotografar?
-- Sim, ótimo, ele não são muito
bonitos? – Quando viajamos da última vez, viajei preocupado, como eles fariam
se não achassem comida na área de preservação que ficava bem em frente a nossa
casa? Escalei vizinhos para a tarefa.
-- Sandra tem duas dúzias de bananas
ai, você pega três, parte em pedaços pequenos e distribui ao longo do muro,
consegue fazer isso? – Eu achava que não minha vizinha Sandra passava a imagem
daquelas que não consegue controlar duas tartarugas, tinha seus filhos e marido
para cuidar, mas parecia ter um coração para lá de bondoso. Chamei Márcio também.
-- Márcio você faz isso?
-- Bah guri, deixa comigo, a
macacada vai ficar até gordinha – sentamos para rir e virámos nosso copo de Budweiser que para ele é a melhor cerveja do
mundo.
-- Como são bonitos não é filho?
Realmente é um privilégio, quando voltarmos de vez para São Paulo, acho que vão
ser o “objeto” de maiores saudades de minha parte.
-- Pai não esqueça dos pica-paus,
dos quero-queros, da revoada dos pássaros pela manhã e após o término da chuva,
tem as aranhas, as cobras, os besouros, os pernilongos, os lagartos...
-- Acho que nem Tarzan sonharia com uma vizinhança tão
abençoada como essa não é filho – Passei a mão em seus cabelos curtos, mania de
passar maquina um, tudo baixinho era como ele gostava.
-- Olha a carinha de medo do
filhote? – Seu olhar estava brilhante como estava brilhante aquele dia, as
cigarras começavam a cantar e Ozzy, nosso membro da família felino saiu
correndo atrás de uma.
Eles começaram a ir, do muro pularam
para os galhos da árvore que ficava rente ao muro.
-- Tem prova hoje?
-- Sim geografia.
-- Estudou? – Sabia que não, sua
vida é entre a quadra e o celular.
-- Não pai, mas a matéria está
fácil.
-- Bom se você se garante está bem,
mas não descuide ok?
-- Tudo bem pai.
-- O Miami jogou ontem gravei o
jogo, vamos ver?
--
Vamos sim pai – ele abriu mais uma banana, nossos vizinhos haviam ido, olhei
para um quero-quero embaixo de uma árvore fugindo da luz ardente do sol, em
breve iríamos partir e esses eram meus vizinhos que eu sentiria tantas
saudades, mas iria feliz porque tive o privilégio de conhece-los.
Meu grande amigo Antonio diria –
coisa de bichinha essa sua mania de bichinhos – e eu devolveria alguma outra
ironia para ele, riríamos um pouco e partiríamos para outra brincadeira
qualquer.
Eu diria que essa minha paixão pela
vida, essa minha força para lutar e resistir e continuar sempre seguindo e
lutando vem deles, da admiração e respeito por eles, era hora de assistir nosso
jogo, pois afinal o basquete move essa família.
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